Caríssimo!
Porque estimo "Benficar" consigo, responde de forma mais completa. Perdoe tornar este comentário numa espécie de divagação filosófica e teológica. Ainda assim, saiba que lhe respondo com aprumo e gosto.
Ora então:
A corruptibilidade pelos instintos materiais (necessidade de segurança, conforto, prazer) que manifestamos, primeiro, como humanos, depois, como animais, depois ainda, como seres no geral que têm necessidade de provimento, é, considero pessoalmente, uma demonstração das lacunas de quem criou tudo isto - quer se atribua tal a uma entidade, a um acaso (que também uma espécie de deus com poderes interessantes, segundo o descrevem) ou mesmo a ambos.
Isto não quer dizer que não possa haver outro tipo de vida, se calhar regulada de outra forma, que seja antítese moral desta e, por consequência, sua superior. Admitindo que exista, o que quer que tenha criado essa tal vida inversa a esta, não poderá sofrer das mesmas lacunas que temos em nós e neste mundo, mesmo na natureza (que nada mais é que uma arena, quando retirados os romanticismos).
Se se crer que a compaixão é uma moral universal (o Benfiquista Félix Bermudes acreditava que sim, por exemplo) e que, motivada por essa moral, esse outro tipo de vida deseje influir nesta, visando promovê-la à sua semelhança, então os humanos, entregues à resolução cíclica da sua própria corrupção (através das consequências programadas nos seus próprios comportamentos) poderão um dia ter escape de tal condição: ser levados pelo voar da Águia (o Símbolo).
E que resolução cíclica é essa, a que estamos entregues? Nenhum rei é eterno e por cada rei sentado em seu trono, há uma multidão de jovens pretendentes à sua cadeira de poder. Assim que este caia, um outro se apressará a declará-lo extinto (e mais que declará-lo, executá-lo) para se poder sentar no seu lugar. Tal como na natureza, uma arena.
Desse modo, há justiça programada nas relações humanas - mas é uma justiça parca, grosseira, essa de nos regozijarmos assistindo à desgraça alheia, ainda que justamente sofrida.
Eu tenho a minha crença pessoal, com certeza que sim, pois nenhum humano vive sem crer (mesmo que diga crer na ausência de crença, o que é uma contradição). O meu caro amigo terá a sua e, no contexto actual, ambos com direito a escolha absolutamente pessoal.
Pela minha parte, creio que a esperança a que toda a vida se agarra perante um obstáculo (ou que é visto como obstáculo) é um impedimento ao desenrolar de qualquer viragem moral, pois, agarrados à esperança, desejamos apenas perpetuar o que de origem causou o dito obstáculo ou perpetuar o estado que nos impede ultrapassá-lo. Por isso se reza, não é?
Rezar é apenas manter viva uma esperança que alimenta aquilo que nos agrilhoa.
Com isto lhe digo o que penso: larguemos esperanças, pois nada mudará.
O Benfica, que é no seu âmago e origem um Símbolo, foi, é e continuará a ser atacado e desrespeitado, porque representa (repito, como Símbolo) o oposto da (i)moralidade vigente desta existência. Por isso, aqueles que subsistem à custa dessa (i)moralidade, são incapazes de conviver com esse Símbolo.
Contudo, se, apesar disso, alcançarmos o desfecho de conquistar torneios regulados por este nível de (i)moralidade, não estaremos já a fazer, nós próprios, essa justiça?
«Hércules e o Carroceiro
Certa vez um Carroceiro estava a levar uma carga pesada ao longo de um caminho enlameado. Finalmente ele chegou a uma parte da estrada onde as rodas se afundaram no lodo até a metade e o quanto mais os cavalos puxavam, mais se afundavam as rodas. Assim, o Carroceiro largou o seu chicote, ajoelhou-se e rezou ao poderoso Hércules: "Oh Hércules, ajude-me nesta minha hora de angústia," implorou. Hércules apareceu a ele e disse:
"Vamos homem! Nada de preguiça. Levante-se e ponha seu ombro à roda.
Os deuses ajudam os que se ajudam a si mesmos."»
Cumprimentos!
A.do Isaías